Nas últimas semanas anda muita gente a comparar o futebol italiano com o futebol português. Não o futebol jogado dentro das quatro linhas, onde seria normal cotejar o primeiro lugar da equipa de Marcelo Lippi com o quarto posto do nosso «sargentão», mas antes o que gira à sua volta e dos seus bastidores.
No fundo, o que as pessoas têm feito é dar o exemplo do chamado «Calciocaos» para julgar e decidir que se fosse em Itália o caso Apito Dourado já estava resolvido há muito. Às vezes gostamos de falar do que não sabemos e caímos no erro de comparar processos que à primeira vista são semelhantes, mas que na verdade correm por trâmites totalmente distintos.
Como naqueles passatempos típicos de Verão, vamos lá ver as sete diferenças entre a fotografia do «Calciocaos» e a do Apito Dourado.
1- Em Itália tudo se passa no âmbito de um tribunal desportivo. Em Portugal são os tribunais comuns e o Ministério Público que tratam do caso.
2- No país da bota às infracções cometidas no mundo da bola correspondem penas que esgotam os seus efeitos nesse universo, ainda que eventualmente acompanhadas de sanções pecuniárias. Ou seja, ninguém pode ser preso porque tentou influenciar o resultado de um jogo de futebol. Por cá, submeteu-se a esfera do futebol ao regime do tráfico de influências em geral e os supostos «traficantes» podem passar vários anos na cadeia se alguém conseguir provar que o dirigente A pediu ao árbitro B que desse uma ajuda para a sua equipa não descer de Divisão!
3- O tipo de tribunal e a natureza das penas a que se sujeitam os prevaricadores italianos permite que os prazos e as garantias da defesa sejam compagináveis com os «timings» desportivos que não podem ser ultrapassados. Tudo o que se passa numa época tem que estar resolvido antes da nova se iniciar. Como em Portugal o que está em jogo é a própria liberdade, é evidente que as garantias da defesa e os prazos não podem ser dispensados ou encurtados só porque o campeonato vai começar dentro de poucas semanas.
4- No caso transalpino quem julga estes casos é gente especializada que sabe da poda. No nosso rectângulo temos juizes que nunca foram a um estádio e têm que recorrer a peritos externos para perceber o que é um fora de jogo.
5- Por lá, quando se detecta uma irregularidade investigam-se os factos, apontam-se os culpados e decide-se o caso, em vez de ambicionar resolver todos os problemas e desgraças do mundo de cada vez que se apanha nas escutas um pobre coitado a pedir fruta para relaxar um trio de arbitragem.
6- No caso italiano a cabeça do polvo, Moggi, foi confrontada com factos indiscutíveis e indesmentíveis e apressou-se a apresentar a demissão dos seus cargos dirigentes, antecipando a sentença. Em Portugal, o Ministério Público montou um circo mediático à volta de dezenas de arguidos, confrontou-os com umas escutas de qualidade duvidosa, misturadas com trechos de mau gosto e total irrelevância, e depois fica tudo muito ofendido porque quem foi exposto ao vexame público não lhes fez a vontade de se demitir.
7- Diferença final. Em Itália os principais beneficiados são os principais prejudicados: os clubes, que assim aprendem a ter mais cuidado na escolha dos seus dirigentes.
P.S: Refira-se que em Itália, os recursos diminuiram e de que maneira os castigos da primeira decisão e ninguém disse que a Justiça estava comprada, ou que "não houve coragem".
Ainda o mesmo Manuel Serrão um dia destes no Expresso bem a propósito do actual momento benfiquista:
ENGENHEIRO DO TENTA
SANTOS da casa não fazem milagres? O meu querido amigo Fernando Santos vai ter de comer o pão que o diabo amassou para responder positivamente a esta questão.
Santo homem que é, em todas as interpretações possíveis da conjunção destas duas palavras, o "engenheiro do penta" do FC Porto vai ter também que fazer das tripas coração para desmentir todos os que já lhe vaticinam que, agora no seu clube de sempre, vai ficar conhecido como o "engenheiro do tenta".
A conferência de imprensa da última quinta-feira, onde imagino que tenha estado pelos cabelos, não foi um começo auspicioso. Aproveitando o intervalo do Portugal o-Sérvia e Montenegro 2, o Benfica decidiu usar os telejornais dessa noite para apresentar o seu novo reforço, Rui Costa, vindo directamente do banco do AC Milan. Depois de conhecido o desfecho dos Sub-21, é caso para dizer que essa noite voltou a confirmar que uma desgraça nunca vem só.
Apesar de tudo, os jovens têm sempre uma grande vantagem sobre os velhos: há sempre uma segunda oportunidade para corrigir a má imagem.
Luís Filipe Vieira e José Veiga acabam de oferecer a Fernando Santos uma ave de rapina: Rui Costa aterrou na Luz com a missão clara de roubar o número 10.0 Benfica está condenado a ser ele e mais dez. Meu caro Fernando: no dia em que o Quinito se lembrou disso nas Antas, acabou o sonho a meio da época
O Benfica 2006/2007 prepara-se para sofrer da síndrome Claudia Schiffer. Há doze anos deslumbrava o mundo. Hoje, continua muito gira mas já não mexe. Há doze anos que os benfiquistas sonham com o regresso do filho pródigo. Damásio teve pena. Vale e Azevedo tinha razão, Vilarinho teve esperança e Vieira tinha que "matar o borrego" .
Há doze anos que Rui Costa se incluiu no rol das exportações do talento nacional. Durante vários anos, o sonho encarnado de o ter de volta era justificado, mas sempre foi mais promessa eleitoral que possibilidade consciente. Agora, quando o jogador já tem 34 anos, parece demasiado pedir-lhe que venha ser o motor do novo Benfica de Fernando Santos.
Se foi o próprio Rui Costa, quando se auto-excluiu da selecção, o primeiro a reconhecer que já não tinha condições para estar no Mundial-2006, como é que é possível pensar que ele estará nas condições ideais para o meio-campo do Benfica até 2007?