terça-feira, dezembro 13, 2005

Pré-históricos


O valor histórico do Benfica-Manchester, que o presidente do FC Porto tentou dissecar na sexta-feira, não se discute. Ou, pelo menos, não devia discutir-se. Normalmente, a História não se decide de um dia para o outro, embrulhada à força numa primeira página, nem costuma deixar que os directores de jornais falem por ela. Imaginemos que o Benfica é campeão europeu; o jogo acabará por perder importância entre os três ou quatro outros momentos históricos necessários para lá chegar. O FC Porto foi campeão europeu de facto e lembro-me de que o anuário de 2004 de um dos nossos semanários quase se esquecia disso, quanto mais do empate "histórico" em Old Trafford que constou do percurso, e a ninguém, mas mesmo a ninguém, ocorreria chamar "histórica" à vitória por 2-1 que o antecedeu, no Estádio do Dragão.

Se quisermos ser maus - e é o caso -, o Benfica é o Artmedia do Manchester United: enquanto em Bratislava os eslovacos perdiam o fôlego perante a façanha que foi a eliminação do FC Porto, em Portugal toda a gente se pergunta como foi possível fazer só um ponto com aqueles nabos. Troque-se Bratislava por Lisboa e Portugal por Manchester e já se compreende o que quero dizer. De um lado, o mérito inquestionável; do outro, o demérito indesmentível. É só para incomodar os adeptos do Benfica que escrevo isto? Não. Escrevo porque acho que seria saudável pôr as actuais circunstâncias em perspectiva: se Co Adriaanse fosse treinador do Benfica e levasse seis pontos de avanço sobre o FC Porto (isto, antes do jogo de ontem à noite), teria a competência enxovalhada ou exaltada? Se, por acaso, tivesse ganho em Bratislava e o Rangers perdido em Glasgow - o que só exigiria um pouco de sorte -, seria agora melhor ou pior do que Koeman, historicamente falando?

Nota: não renego as críticas que também fiz e continuarei a fazer ao treinador do FC Porto; repudio é o enxovalho permanente em que esse exercício se tornou, algumas vezes sem outra razão que não seja a profunda ignorância dos autores.

José Manuel Ribeiro in Ojogo