Rui Moreira na Abola:
Mais vale doze do que oito e oitenta
A Reboleira aconteceu tudo o que não podia suceder. Não pelo resultado, já que não se pode ganhar sempre. É normal perder-se pontos, seja pelo mérito ou pelo catenaccio do adversário seja por erros de arbitragem. Desta vez foi diferente: o FC Porto esbanjou a vantagem de dois golos que merecera e conseguira sem grande esforço e desperdiçou os pontos por culpa própria. Por azar e aselhice, e sem grande mérito do Estrela.
Jesualdo atribuiu as culpas à falta de atitude da equipa, evitando crucificar Helton e Stepanov, cujos lapsos individuais foram a causa próxima do descalabro. Quem não gostou do remoque foi Bosingwa, que reagiu a quente e contrariou o treinador. Com mais prudência e tacto, também Bruno Alves discordou do diagnóstico do professor. Ora, percebe-se que, por pedagogia e a bem do espírito do grupo, Jesualdo tenha resistido a imolar os dois principais culpados mas talvez devesse, então, ter assumido também uma parcela desse ónus, como fez Paulo Bento em Braga. A verdade é que quando Lucho saiu (e via-se que estava a jogar em sacrifício) toda a equipa oscilou. Desta vez as substituições e as alterações tácticas não ajudaram, se calhar porque não estavam no banco os jogadores mais apropriados, ou porque faltam os Ibsons e Jorginhos (os tais brasileiros de que falei há tempos) para congelar a bola longe da nossa área.
Felizmente, não creio que este conjunto de desventuras se vá repetir e seria um escândalo se esta equipa não chegasse para uso doméstico. O único motivo para alarme é o estado de espírito dos adeptos que, mimados por anos de ouro, oscilam entre o oito e o oitenta, entre a exaltação e a depressão. Há mesmo aqueles que exultam de forma acrítica quando a equipa ganha mesmo que nada jogue mas que não toleram qualquer mau resultado e, à primeira contrariedade, soltam os assobios.
Lembro-me dos anos cinzentos em que, apesar dos insucessos ditados pela fraca gestão e pelo sistema instalado, nada ganhávamos. Apesar disso cerrávamos fileiras, apoiávamos a equipa até ao último minuto e só depois, se as coisas corriam mal, exibíamos o nosso desgosto, atirando para o relvado as almofadas alugadas aos meninos do Terço. É natural que sejamos exigentes mas a equipa precisa do nosso apoio sensato.
Espero que não seja preciso um novo ciclo de reveses para readquirirmos a garra que fazia de nós todos, e não apenas das incansáveis claques, o 12.º jogador em campo.