quarta-feira, setembro 13, 2006

Já enjoa

Autoridades italianas querem contrato de jogador do Benfica

"CALCIOCAOS" : Investigadores querem ver esclarecidos contornos do empréstimo do avançado Miccoli ao clube da Luz

O escândalo de corrupção no futebol italiano, conhecido como "calciocaos", pode vir a envolver o futebol português, já que as autoridades italianas querem ver esclarecidos os precisos contornos do empréstimo do avançado Fabrizio Miccoli pela Juventus ao Benfica. No âmbito das investigações do maior escândalo no futebol italiano, que implicou a despromoção da Juventus, os investigadores suspeitam que mais de quatro dezenas de contratos de jogadores podem ter envolvido fraudes fiscais, suspeitas que incluem a cedência do avançado do Benfica.

Na procuradoria de Turim está apreendida documentação relacionada com numerosos contratos de jogadores, entre os quais o de Miccoli, mas também o de Zine-dine Zidane, que se transferiu da Juventus para o Real Madrid, em 2001, contra o pagamento de 66 milhões de euros. Sob suspeita estão igualmente as transferências de outros jogadores, nomeadamente do internacional sérvio Darko Kova-cevicparaaRealSociedad, deVan der Sar, guarda redes internacional holandês, para um clube inglês, e de Vicenzo Maresca, actualmente ao serviço do Sevilha.

Os investigadores italianos deram já conhecimento às autoridades judiciárias portuguesas da sua intenção de se deslocarem a Lisboa, no âmbito das investigações da vertente negócio de compra-venda de jogadores do calciocaos. O objectivo é o de contrastar a informação que resulta dos documentos que foram confiscados na busca às instalações da Juventus com aquela que está registada em Portugal. Pretende-se proceder à verificação dos indícios da existência de fraude fiscal apurados no decurso das investigações que decorreram em Itália.

As autoridades italianas suspeitam da existência de contratos paralelos e poderão querer confirmar se a situação se estende também ao nosso país, devendo ainda apurar o montante dos rendimentos auferidos por Miccoli para determinar se houve ou não evasão fiscal em Itália.

Além da apreensão de documentos contratuais, referências a Fabrizio Miccoli foram detectadas nas escutas do calciocaos. Segundo um telefonema interceptado entre Luciano Moggi, director-geral da Juventus, e Marcello Lippi, o selecionador italiano, a possibilidade de Miccoli jogar pela equipa italiana estava dependente do seu comportamento. Moggi estaria descontente com algumas declarações públicas do jogador e daria conta ao seleccionador que, caso aquele não revisse a sua posição, não deveria ser incluído nas escolhas da equipa principal da Itália.

Refira-se ainda que Miccoli, hoje com 27 anos, começou a carreira no Ternana, regressando à Juventus em 2003. No Verão de 2005, no último dia de mercado, assinou um contrato de empréstimo válido por uma época com o Benfica, num negócio tratado com José Veiga.

Com o rebentar do escândalo em Itália e com a descida da Juventus ao segundo escalão do futebol profissional, o Benfica conseguiu assegurar por mais um ano o empréstimo de Miccoli, com opção de compra, no final desta época.


José Veiga pediu a Valentim para reduzir multa

Director-geral do Benfica também falou com Pinto de Sousa para contactar árbitro que iria apitar o Estoril

A redução de uma sanção da inibição de conduzir de seis para três meses, na sequência de um caso de excesso de velocidade cometido por José Veiga, valeu a extracção de mais uma certidão no âmbito do processo Apito Dourado. O procurador de Gondomar entendeu então que os vários telefonemas interceptados entre o presidente da Liga e o actual dirigente do Benfica davam conta de que aquele último pretendia os favores de Valentim Loureiro para lhe reduzir uma proibição de conduzir. Valentim terá então prometido que falava com o governador civil de Aveiro e a pena, depois de aplicada, foi mesmo reduzida. O procurador de Gondomar entendeu então que o caso configurava eventuais crimes de denegação de justiça e prevaricação e ordenou a extração de certidões. O inquérito mantém-se ainda em Gondomar.

Outra escuta também interceptada pela P J, e onde os interlocutores foram José Veiga e Pinto de Sousa, não foi considerada suficiente pelo mesmo magistrado para imputar qualquer crime aos intervenientes. Naquela, o ex-empresário era ainda o patrão do Estoril e falou com Pinto de Sousa, que geria a arbitragem na federação, para que aquele "contactasse" o árbitro Jorge Sousa, de forma a que o Estoril fosse "beneficiado" no jogo seguinte. Pinto de Sousa disse que sim, mas o Ministério Público entendeu que a matéria apurada não era suficiente. É que, embora o Estoril tenha ganho o jogo por 0-1, batendo a União da Madeira, não ficou suficientemente demonstrado quais as contrapartidas recebidas pelo árbitro, para justificar a existência de crime.


Director-geral do Benfica era administrador da SAD do Estoril

Veiga apanhado nas escutas a pedir favores a Valentim

José Veiga, actual director-geral do Benfica e, em 2004, o maior accionista da SAD do Estoril, foi outra das figuras do futebol português a ser apanhada nas escutas do Apito Dourado.

O dirigente desportivo foi interceptado em pelo menos duas conversas telefónicas com Valentim Loureiro, à data presidente da Liga de Clubes. Foi em Março de 2004 e o objectivo do ex-empresário de jogadores com licença da FIFA era conseguir que a interdição do estádio do Marco de Canaveses coincidisse com o jogo do Estoril Praia. Veiga queria evitar que a sua equipa se deslocasse a um terreno tradicionalmente difícil e facilitar assim a tão almejada pontuação que nesse mesmo ano lhe viria a possibilitar a subida ao principal escalão do futebol.

Antes desse jogo, que aconteceu a 28 de Março de 2004 e em que o Estoril ganhou por 3-2 ao Marco de Canaveses, José Veiga fez dois telefonemas a Valentim Loureiro. No primeiro pediu que o estádio do Marco fosse interditado. A possibilidade tinha sido aberta devido ao incidente ocorrido cerca de um mês antes (quando Avelino Ferreira Torres pontapeou as placas de publicidade e cadeiras do recinto, ameaçando ainda o árbitro) e José Veiga pretendia então que a interdição coincidisse com o jogo da sua equipa.

Valentim Loureiro ainda tentou que o dirigente do Estoril falasse directamente com Gomes da Silva, então presidente da Comissão Disciplinar da Liga de Clubes, ou que utilizasse a sua influência através dos jornais. "Pressiona-os", aconselhou o presidente da Liga, acabando por aceder, mais tarde, a dirigir ele próprio o pedido ao juiz desembargador Gomes da Silva. "Eu falo com o gajo", prometeu.

Dias depois, Veiga conheceu a decisão da Liga. O estádio do Marco havia sido interditado por dois jogos e a equipa teria de ir jogar em campo alheio, quando recebesse o Estoril Praia. E não se esqueceu de agradecer a ajuda de Valentim Loureiro. "Vou-lhe dar uma beijoca", brincou Veiga, ao que Valentim respondeu: "Se não fosse eu...".

Constituído arguido na sequência das escutas

Ainda na sequência da mesma interdição, o Marco teve de ir jogar a casa emprestada. E o curioso é que acabou por ser o Boavista, clube dirigido pelo filho de Valentim Loureiro, a ceder o campo. Marco e Estoril defrontaram-se no Bessa a contar para a 28.ª jornada e a vitória dos canarinhos permitiu ao clube da Linha reforçar a liderança, passando a ter 11 pontos sobre o quarto classificado.

Os relatos da altura mostram também que a arbitragem do jogo foi polémica. O Estoril marcou primeiro, o Marco empatou. O "caso" do jogo aconteceu quando, pouco antes do intervalo, o árbitro perdoou um segundo cartão amarelo a um jogador do Estoril que, no tempo de compensação e ainda antes da paragem do jogo, fez o passe para o segundo golo dos estorilistas. Nos primeiros minutos da segunda parte, o Estoril aumentou para 3-1 de penálti, mas não existe nos jornais da época qualquer referência ao castigo máximo. O primeior golo do Estoril também foi por autogolo do Marco.

O árbitro desse jogo foi João Ferreira, o mesmo que esteve envolvido nas escutas noticiadas a semana passada pelo PÚBLICO, como tendo sido aceite por Luís Filipe Vieira para arbitrar as meias-finais da Taça de Portugal, na época 2003-2004.

Na sequência destas e de outras escutas, José Veiga foi interrogado e constituído arguido no processo Apito Dourado, tendo sido extraídas pelo menos duas certidões para o Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa.

O PÚBLICO sabe que não foi feita qualquer outra diligência, embora o arquivamento pareça ser o caminho mais provável. É que, paralelamente, foram extraídas certidões das mesmas escutas, que foram enviadas para o Supremo Tribunal de Justiça. O alvo da investigação era, nesse caso, Gomes da Silva, juiz desembargador no Tribunal da Relação de Guimarães, mas o Ministério Público considerou que as conversas telefónicas não eram suficientes para o indiciar por qualquer crime.

Gomes da Silva viu ainda ser arquivados dois casos que envolviam o clube liderado por Pinto da Costa. Diziam respeito à punição de José Mourinho pelo alegado rasgão da camisola de Rui Jorge, do Sporting, e à eventual pressão dos azuis e brancos para castigar Deco de forma mais branda, depois daquele ter lançado a chuteira contra o árbitro Paulo Paraty, no jogo Boavista-FC Porto.

Ontem, o PÚBLICO tentou ouvir Valentim Loureiro e José Veiga sobre as referidas escutas, mas ambos os dirigentes se mantiveram incontactáveis durante todo o dia. O PÚBLICO tentou ainda contactar o assessor de imprensa do Benfica, que igualmente não respondeu aos nossos contactos telefónicos.


Pinto da Costa indicou árbitro para a final da Taça de 2002/2003

Presidente do FC Porto deu indicações a Pinto de Sousa, do Conselho de Arbitragem da Federação, sobre o nome do árbitro que devia apitar a final da Taça de Portugal, na época 2002/2003. Ministério Público viu nisso indício de crime, mas, no caso de Luís Filipe Vieira, não foi feita qualquer diligência. Porém, há outras escutas a comprometer o presidente dos encarnados.

Uma situação idêntica à verificada com Luís Filipe Vieira - que, conforme o PÚBLICO ontem noticiou, escolheu o árbitro que devia estar presente nas meias-finais da Taça de Portugal, na época 2003/2004 - aconteceu com Pinto da Costa, na final da Taça da época anterior. No entanto, nessa conversa, onde Pinto da Costa sugere a Pinto de Sousa, presidente do Conselho de Arbitragem da Federação, a indicação do nome de Pedro Henriques, árbitro de Lisboa, o procurador de Gondomar viu indícios de crime. Aliás, foi essa uma das situações pelas quais o presidente dos azuis e brancos foi indiciado e que motivaram a sua detenção, até ser ouvido em primeiro interrogatório, em Dezembro de 2004.

Na mesma escuta, que aconteceu a 26 de Maio de 2003 e que antecedeu a final FC Porto-União de Leiria, Pinto da Costa conversou com Pinto de Sousa sobre a possível nomeação de Isidoro Rodrigues. O presidente do Conselho de Arbitragem deu-lhe conta de que a nomeação não agradava ao presidente dos leirienses, João Bartolomeu, e que este ameaçara fazer um escândalo quando soube que aquele árbitro seria o designado. "O gajo sabe que está para ser o Isidoro... e disse que a equipa não comparece, (...) que é um escândalo. (...) Se o gajo vai para lá todo f... da cabeça, estraga a festa", alertava Pinto de Sousa, sugerindo a Pinto da Costa que pensasse noutra opção.

Na mesma escuta telefónica, transcrita no processo principal do Apito Dourado, o líder dos azuis e brancos apresenta outras hipóteses para o mesmo jogo. Primeiro sugere o árbitro António Costa, depois Pedro Henriques. A escolha acaba por recair no segundo, depois de Pinto da Costa entender ser aquele o árbitro ideal, por ser o primeiro classificado pelo Conselho de Arbitragem. Mas Pinto da Costa diz também a Pinto de Sousa que pode mudar o nome, se assim o entender. "Por mim, estás à vontade. Se vires que te defende mais outro, põe outro", afirmou.

Anexada ao processo em Setembro de 2003, a escuta telefónica levou o procurador a entender que havia indícios de crime. Na opinião de Carlos Teixeira, aquela conversa do líder do FC Porto significava então que o dirigente estava a influenciar a escolha do árbitro e assim tentava obter benefícios para o FC Porto.

Os motivos que o levaram a ter um entendimento diferente para o caso do Benfica são uma incógnita. No entanto, Luís Filipe Vieira ainda poderá vir a ser chamado nas certidões que se mantêm em investigação em Lisboa, para responder sobre a escuta ontem noticiada pelo PÚBLICO e outras obtidas no mesmo processo.

Aliás, segundo o PÚBLICO soube, há mais conversas comprometedoras com o presidente dos encarnados. O interlocutor era normalmente Pinto de Sousa, cujas certidões se mantêm em investigação, mas Luís Filipe Vieira nunca foi interrogado.

Entretanto, o Belenenses anunciou ontem que se irá constituir assistente no processo para tentar perceber se foi de alguma forma prejudicado - era o adversário do Benfica no jogo onde Luís Filipe Vieira recusou o nome de quatro internacionais, acabando por aceitar a designação de João Ferreira, que hoje estará no Bessa a arbitrar também o clube da Luz.

Acompanha assim o Benfica, que já anunciara a intenção de se constituir assistente nas escutas que envolvem o FC Porto e Boavista, bem como o árbitro Pedro Proença, que, no ano passado, manifestou também o mesmo desejo.


DESCUBRA AS DIFERENÇAS...COMO ANDA A JUSTIÇA EM PORTUGAL...UM É CONSTITUÍDO ARGUIDO PORQUE QUER O 1º CLASSIFICADO DOS ÁRBITROS...O OUTRO NEM OUVIDO É QUANDO ESCOLHE UM ÁRBITRO A DEDO, RECUSANDO MUITOS OUTROS...É UMA PALHAÇADA!!!! É ISTO QUE REVOLTA!!!

Parte das escutas telefónicas onde são intervenientes Pinto da Costa e Luís Filipe Vieira. O primeiro caso acontece antes da final da Taça de 2002/2003 e o segundo a dois dias da meia-final de 2003/2004.


Pinto de Sousa (PS) - O gajo [João Bartolomeu] sabe que está para ser o Isidoro e disse que é um escândalo. (...) Vamos ver calmamente com ele o que é que ele quer.
Pinto da Costa (PC) - É! Senão... mais vale pôr o António Costa, que ninguém discute. (...) Quem está em primeiro, não sabes?
PS - Tenho a impressão que é o Pedro Henriques.
PC - Isso, era espectacular pôr esse. (...) É sempre aquilo, nem bem nem mal.


Luís Filipe Vieira (LFV) - Eu não quero entrar mais em esquemas nem falar muito...
(...) Valentim Loureiro (VL) - Eu penso que ou o Lucílio... o António Costa, esse Costa não lhe dá... não lhe dá nenhuma garantia?
LFV - A mim?! F.., o António Costa? F... Isso é tudo Porto!
VL - Exacto, pronto! (...) E o Lucílio?
LPV - Não, não me dá garantia nenhuma o Lucílio!
VL - E o Duarte?
LPV - Nada, zero! Ninguém me dá!... Ouça lá, eu, neste momento, é tudo para nos roubar! Ó pá, mas é evidente! Mas isso é demasiado evidente, carago! Ó major, eu não quero nem me tenho chateado com isto, porque eu estou a fazer isto por outro lado. (...)
VL - Talvez o Lucílio, pá!
LPV - Não, não quero Lucílio nenhum! (...)
VL - E o Proença?
LPV - O Proença também não quero! Ouça, é tudo para nos f...!
VL - E o João Ferreira?
LPV - O João... Pode vir o João. Agora o que eu queria... (...) Disseram que era o Paulo Paraty o árbitro... O Paulo Paraty! Agora, dizem-me a mim, que não tenho preferência de ninguém (...) à última hora, vêm-me dizer que já não pode ser o Paulo Paraty, por causa do Belenenses.


No Público.