O complexo

JOSÉ MANUEL RIBEIRO in ojogo

É verdade: olhamos sempre de lado para os políticos que se infiltram nas tribunas VIP. Alguns, talvez a maioria, parecem sempre deslocados, como se tivessem plena consciência de que estão a estorvar. São guarda-fatos no meio do corredor e, tal como os guarda-fatos, não conseguem mexer-se sozinhos: precisam de uma equipa de mudanças. Outros têm mesmo de lá estar, porque representam o país. O papel deles é dar dimensão nacional aos jogos; é afirmar "Portugal está com estes fulanos". No fundo, é uma formalização daquele apoio que toda a gente, de todas as cores, tem dado nas declarações públicas, ao longo desta Liga dos Campeões. Valerão todas zero se, na hora certa, não estiver ao lado de Pinto da Costa o presidente da República, o primeiro-ministro ou ambos, para garantir que é mesmo assim; como esteve o rei de Espanha no Riazor, na meia-final. Quem praticou desporto de competição na infância ou adolescência conhece a importância de ver o pai na bancada. O FC Porto, que tem um famoso complexo a esse respeito, quer o país na bancada. Se ele lá não estiver, haverá nessa falta mais do que negligência paterna: será a marginalização plena e a orfandade. Os líderes parlamentares do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda desancaram Durão Barroso pela anunciada presença em Gelsenkirchen com argumentos que, por esta altura, são irrelevantes. Seja qual for o lado da razão neste caso, ressalta é a evidência da regra: não me lembro de polémicas do género envolvendo qualquer outro clube, mas há sempre sarilho quando está em causa a presença dos nossos representantes nos jogos do FC Porto. Sempre. Porque os deputados justificaram as faltas com a presença em Sevilha; porque o presidente da Assembleia da República não foi convidado para não sei o quê; porque Durão Barroso ia estar na inauguração do novo estádio e isso significava que estava a vergar-se a Pinto da Costa. Porque, porque, porque. Os complexos, psicóticos ou não, têm sempre uma origem. A deste está bem à vista.