Francisco José Viegas no JN:
Álvaro Magalhães no JN:
As coisas são geralmente merecidas
1. Era uma alegria - o F. C. Porto defrontava o Atlético e devolvia a rapaziada a Alcântara com uma palmada nas costas. Não foi assim. Os de Alcântara regressaram em festa e o Dragão ficou deprimido, às voltas com o primeiro miniterramoto verdadeiro desde que Jesualdo Ferreira entrou no balneário para pegar numa equipa sem muita confiança. Neste tempo, o F. C. Porto ganhou confiança - e a jornada da Taça foi obra de confiança em excesso. Não vale a pena argumentar que se tratou de uma equipa de segunda linha; vejam os convocados - eles são jogadores do F. C. Porto. Isto acontece aos melhores de todos os campeonatos e já ocorreu, inclusive, com o próprio F. C. Porto. Eu, por mim, punha-os de castigo, mas já se sabe - eu não sou treinador, e na verdade eles precisam de jogar este fim-de- -semana e vem aí o Chelsea.
Em resumo foi bem feito. E sempre deu origem a piadas bem merecidas.
2. Jesualdo defendeu a "paragem de Inverno". Continuo a dizer que é errada. Uma semana de férias compreendia-se, no limite; mas isto? Jogadores regressados em stress, ritmos que se perdem - e, sobretudo, adversários que retomam a pista. Se não se importam, dêem Clausewitz a ler ao treinador até Maio, a guerra é geral, é permanente, é total, é impiedosa e deve ser humilhante para os adversários. Não basta ganhar e estar na frente: é preciso que o adversário não tenha tempo de recuperar. Mourinho sabia. Jesualdo sabe, mas é um bonzão de feitio. Não pode.
3. E vem aí o Chelsea com "meio Mourinho", que nunca pareceu admitir bem a hipótese de ter uma equipa construída à semelhança do Real Madrid, com estrelas que não o deixam jogar como gosta. "Meio Mourinho" também é uma expressão de que gosto - ele merece. Inclusive merece algumas piadas sobre o seu sucesso incontinente. "Meio Mourinho" sim, porque está com um pé de fora e vai repetir o ar enfastiado com que, há anos, saiu do F. C. Porto pela porta lateral. Na época, o conflito foi mal resolvido e continua por esclarecer; mas foi no F. C. Porto que Mourinho conseguiu construir uma equipa de verdade, a jogar como ele gosta, a ganhar o que havia para ganhar. No Chelsea, Abramovich impôs jogadores e julgou que milhões faziam uma equipa. Enganou-se. Também ele merece perder. Para já, até ao fim da época perdeu meio Mourinho.
4. O Benfica ganhou o torneio do deserto sem marcar um golo regulamentar. Se marcasse um golo que fosse, as primeiras páginas da "imprensa desportiva" já lhe chamavam campeão nacional. Parabéns, ainda assim. O Bayern e a Lazio não são o Atlético, bem vistas as coisas - e eu não sou injusto. Sou apenas meio hooligan de sofá.
5. A parvoíce da "paragem de Inverno" interrompeu o que não podia ser interrompido. Daqui até Maio (tirando uns "jogos europeus" e pausas para a selecção) o essencial é o campeonato, e todos o sabem.
Álvaro Magalhães no JN:
Teoria da catástrofe
Quando o futebol é bebido pela Taça, que celebra o episódico transtorno da ordem estabelecida, a surpresa é não haver surpresas. Mas a derrota caseira do F. C. Porto às mãos do Atlético, foi bem mais do que isso. Depois de ter atravessado todo o ano de 2006 sem perder em casa, cair nesse pecado com uma equipa saída dos cromos da nossa infância é mais parecido com uma catástrofe.
Ora bem, todas as catástrofes têm a sua teoria, como se sabe. Esta tem três, pelo menos. A primeira relaciona-se com o sortilégio da Taça. Com a sua noção de festa e romaria dominical, ao sol da tarde, ela incita aos milagres diurnos, abrindo a possibilidade do conto de fadas, onde anões aplicados derrubam gigantes distraídos e sobranceiros, ou apenas preocupados com outras batalhas, mais compensadoras. Na verdade, nesta nossa Taça já não há gigantes ou anões, apenas gigões e anantes (expressão roubada a um livro de Manuel António Pina) gigões são anantes muito grandes; anantes são gigões muito pequenos.
E assim chegamos à segunda teoria, a do "fiquem lá com a taça".
Quando um desses gigantes chega à zona restrita da Liga dos Campeões (coisa rara, mesmo para gigantes muito grandes), os jogos da Taça são um estorvo também muito grande. O Barcelona, por exemplo, já foi eliminado da Taça por um clube amador, o Figueres, e, noutra ocasião, abandonou pura e simplesmente a prova. De facto, e à luz do ditado que nos garante que "quem tudo quer, tudo perde", a Liga dos Campeões e a Taça opõem-se como estirpes de uma radiação incompatível.
Não quero dizer, longe disso, que o F. C. Porto perdeu de propósito com o Atlético para poupar cinco desses jogos inoportunos. Ninguém treina as derrotas, nem Quaresma treina os pontapés ao poste quando não convém marcar golos, como já acontecera, de resto, no jogo com o Arsenal. Mas tudo isso está no âmago dos jogadores e gera a displicência que, por sua vez, gera as melhores catástrofes, aquelas que trazem mais benefícios do que malefícios.
Vejo, pois, na conjugação destas duas teorias uma explicação para o desastre de domingo passado. Porém, há ainda uma terceira, erguida pelo país contentinho, que a festejou como se fosse uma vitória da Pátria e que radica na esperança de que tão assombrosa derrota só pode ser um sinal de quebra e decadência. Disse Miguel Veloso logo no dia seguinte "Eles vão perder pontos" e, mais recentemente, Farnerud: "Agora há menos medo do F. C. Porto. Fico a torcer para que os reflexos da eliminação na Taça se mantenham na Liga".
A todos estes teóricos da desgraça alheia responderá certamente a equipa do F. C. Porto no tão aguardado jogo de hoje na Vila das Aves, enviando-lhes, no final, um sinal idêntico a esta cordial saudação que acabo de encontrar num blog "Parabéns ao Benfica, ao Sporting e a toda a selecção nacional antiportista pela continuidade na mui prestigiada Taça de Portugal.
No Porto, resta-nos apenas a Liga dos Campeões e a liderança na Liga".