Todas as épocas, desde há dez anos, o Benfica começa por ser um medicamento revolucionário que vai erradicar o cancro. Os testes preliminares são fenomenais, os ratinhos brancos são curados às ninhadas inteiras de cada vez, a crítica derrete-se em considerandos sobre a nova era de saúde e prosperidade que todos temos pela frente. Mais tarde ou mais cedo, percebe-se que os ratinhos são um mercado limitado. A maioria deles nem sequer tem emprego e os poucos que têm são desenhos animados. Por muito agradável que seja a adulação, é imprescindível passar dos ratos aos homens. O ensaio deste ano estava agendado para anteontem, em jejum e com a primeira urina da manhã num frasquinho, como já veremos. À semelhança de tantas outras épocas antes, ao invés de fazer o tumor desaparecer como estava prometido, o medicamento milagroso fê-lo duplicar de tamanho. Seria um falhanço rotundo se, no meio do desastre, não tivesse florescido a dúvida abençoada, ou melhor, a sorte grande: duas. Duas dúvidas ditosas que salvaram Luís Filipe Vieira e José Veiga da derrota completa, depois de achincalhados pelos Superdragões ao cabo de uma operação ardilosa que pareceu projectada a meias por Maquiavel e pelo Bugs Bunny. Imaginemos que não havia lances polémicos ou que o jogo corria de tal maneira que, apesar do génio demonstrado no estratagema dos bilhetes, Vieira e Veiga não conseguiam extraí-los dos noventa minutos. O que teria sobrado do medicamento? O suficiente para um clister, ao menos? Que farmacêutica arriscaria pegar na droga, por muito predisposta que estivesse para o grande negócio, conforme o demonstrado por algumas primeiras páginas de ontem? Assim é melhor para todos; a dúvida mantém-se e continuará a haver crentes no milagre. Pelo menos enquanto os ratinhos não perceberem como é fácil deixar a ratoeira sem queijo.
José Manuel Ribeiro
Os cobardes adoram linchamentos
Há 4 horas