Afinal, o treinador não rasgou a camisola de Rui Jorge no final do último Sporting-FC Porto. O Conselho de Justiça da FPF deu provimento ao recurso apresentado pelo ex-treinador do FC Porto da decisão da Comissão Disciplinar da Liga que o condenou a 10 dias de suspensão e ao pagamento de multa de três mil euros.
No acordão, refere-se que não há quaisquer imagens do incidente, frisando-se não haver qualquer razão para considerar o depoimento do roupeiro do Sporting mais credível que o do roupeiro do FC Porto.
O Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol deu razão a José Mourinho, considerando procedente o recurso apresentado pelo ex-treinador do FC Porto a propósito do episódio da camisola de Rui Jorge, rasgada no final do último Sporting-FC Porto. Recorde-se que o caso da camisola e das afirmações consideradas antidesportivas proferidas pelo agora técnico do Chelsea no final do referido encontro tinham justificado a aplicação de uma suspensão de 10 dias acrescida de multa no valor de três mil euros a José Mourinho. O acórdão do Conselho de Justiça, datado de 30 de Setembro, vem agora dar razão ao ex-treinador do FC Porto, absolvendo-o de todas as acusações "por falta de fundamentação no que concerne à prova de facto". Em contrapartida, negou provimento ao recurso interposto pelo Sporting que alegava a ilegitimidade do FC Porto recorrer do acórdão da Comissão Disciplinar da Liga na hipótese de o advogado Daniel Pereira actuar em representação do clube e não de José Mourinho. Mais do que isso, negou provimento às pretensões de aplicação de penas concretas para cada uma das infracções praticadas por José Mourinho.
Em causa estavam três situações distintas. A expressão utilizada por José Mourinho no final do encontro para o descrever - "uma grande merda de jogo" -; a interrupção das afirmações de Pedro Barbosa durante a "flash interview" - "não digas isso Pedro, sabes que estás a mentir, não te fica bem mentir" - e, finalmente, as circunstâncias que rodearam a entrega da camisola rasgada.
Com base nesta matéria o CJ revelou um entendimento diametralmente oposto ao da Comissão Disciplinar da Liga. Assim, os juízes da Federação sublinham que o número 1 do artigo 87º - utilizado como argumento pela Comissão Disciplinar para punir o primeiro comentário de José Mourinho ao jogo - exige que a expressão proferida se dirija a pessoas singulares ou colectivas integradas na FPF. Ora, apesar de admitir que a expressão "uma grande merda de jogo" não prima pela eloquência, o Conselho de Justiça sublinha que "não se alcança que dela resulte uma ofensa directa a qualquer dessas pessoas".
Quanto ao ocorrido durante a "flash interview", o acórdão, a que O JOGO teve acesso, considera que, apesar da postura censurável de José Mourinho ao interromper quem está no uso da palavra, tal impropriedade não pode ser classificada de injuriosa, pelo que não pode haver condenação.
Finalmente, quanto ao caso da camisola rasgada, o Conselho de Justiça sublinha que dos depoimentos das testemunhas ouvidas no processo resulta que nenhuma delas afirmou ter presenciado o momento em que a camisola foi rasgada. De resto, para além dos roupeiros dos dois clubes, todas as testemunhas depõem sobre a situação que lhes foi comunicada por outrém.
Refere também o acórdão que - ao contrário do que foi afirmado pelos dirigentes do Sporting logo no final do encontro - "não foram captadas quaisquer imagens pelo sistema de vídeo interno que possam ser utilizadas, com propriedade, na análise deste item".
Restam as versões antagónicas dos dois roupeiros, com o elemento do Sporting a afirmar que o o funcionário do FC Porto lhe entregou a camisola rasgada com o recado de que teria sido José Mourinho o responsável, facto que o roupeiro portista sempre negou. Versões que lançam dúvidas sobre o que de facto aconteceu e que, segundo o Conselho de Justiça, "não se dissipam após análise apurada dos restantes meios de prova". De resto, frisa o acórdão, "não se percebe que razão permita sustentar a versão do roupeiro do Sporting mais credível que a do roupeiro do FC Porto", levando aquele órgão a concluir que não resultou provado que José Mourinho tenha, de facto, rasgado a camisola de Rui Jorge.
Matéria Factual
É a seguinte a matéria factual dada como provada pela Comissão Disciplinar relativamente ao Sporting-FC Porto disputado a 31 de Janeiro, no Alvalade XXI.
"No final da partida e quando o arguido se dirigia para o túnel foi abordado pelos jornalistas com o objectivo de ouvirem as suas impressões e comentário sobre o jogo, tendo, o arguido, nessa ocasião, afirmado ter sido "uma grande merda de jogo", expressão essa que foi difundida pela rádio, nomeadamente pela Rádio Renascença.
Aquando da realização do Flash Interview e quando o jogador do Sporting, Pedro Barbosa, ao ser entrevistado expressava os seus pontos de vista sobre o jogo em causa, o arguido interferiu na conversa dizendo "não digas isso Pedro, sabes que estás a mentir, não te fica bem mentir".
Após o jogo ter terminado, o técnico roupeiro do Sporting, Paulo Gama, a pedido de Rui Jorge e de outros jogadores do Sporting, dirigiu-se aos balneários do FC Porto, levando consigo diversas camisolas do Sporting para serem trocadas por camisolas de jogadores do FC Porto, tendo concretamente levado duas camisolas do jogador Rui Jorge com o nº 23, a fim de serem trocadas pelos jogadores do FC Porto, Jorge Costa e Deco.
O referido roupeiro, Paulo Gama, ao chegar junto da porta do balneário do FC Porto, encontrou os jogadores Vítor Baía e Nelson, sendo que após explicar-lhes o motivo e razão da sua presença, o jogador, Vítor Baía, disse ao roupeiro que ali aguardasse e, tomando as camisolas, levou-as consigo, a fim de as entregar aos destinatários.
Volvidos alguns instantes, cerca de 1 ou 2 minutos, o técnico roupeiro do FC Porto, Fernando Agostinho M. Brandão, chegou junto ao roupeiro do Sporting, entregou-lhes as duas camisolas do Rui Jorge, sendo que uma delas vinha rasgada.
Nesse acto, disse ao roupeiro da SAD sportinguista que o "o Mister mandou dizer que a tinha rasgado e ainda para dizer ao Rui Jorge que queria que ele morresse em campo".
Posteriormente, o técnico roupeiro do Sporting, dirigiu-se para o seu balneário relatando o sucedido, mormente ao Rui Jorge sendo que, em consequência de tal relato, os jogadores do Sporting ficaram agitados, exaltados e ruidosos.
O treinador da SAD Sportinguista, Fernando Santos, ao ouvir barulho saiu da sua cabine, deparando com os seus jogadores exaltados, designadamente Hugo e Beto, transmitindo-lhe os factos acima relatados.
O treinador da Sporting SAD, após constatar que a referida camisola se encontrava rasgada e com intenção de evitar que os seus jogadores, face à exaltação em que se encontravam, se dirigissem ao arguido a fim de tirar desforço, pegou na dita camisola e dirigiu-se ao seu colega, ora arguido, com vista a esclarecer o relatado.
Fernando Santos encontrou o arguido no hall principal, junto ao balneário do FC Porto, dirigiu-lhes mostrando a dita camisola rasgada e perguntou ao arguido "achas bem o que fizeste de rasgar a camisola e de dizer que o jogador devia morrer em campo?"
O arguido, perante tal "acusação" proferida pelo seu colega de profissão, não a negou, nem confirmou, mostrando-se muito exaltado e nervoso.
O arguido é primário, pois do seu registo disciplinar não consta a prática de qualquer infracção.
Com base nesta matéria, entendeu a Comissão Disciplinar da LPFP condenar o recorrente pela prática dos seguintes ilícitos:
Artigo 107º, nº 1, segundo o qual, " os dirigentes que praticarem os factos previstos no nº 1 do artigo 87º contra os membros dos órgãos da estrutura desportiva, elementos da equipa de arbitragem, dirigente, jogadores e demais agentes desportivos, são punidos com a pena de suspensão de um mês a um ano e multa de ¤ 1.000,00 a ¤ 10.000,00".
Por sua vez, o artigo 87º, nº 1 estipula que "Os clubes que desrespeitarem ou usarem de expressões, desenhos, escritos ou gestos injuriosos, difamatórios ou grosseiros para com pessoas singulares ou colectivas integradas na F.P.F, (...), por exercício das suas funções, são punidos com a multa de ¤ 2.500,00 a ¤ 7.500,00".
Artigo 109º, nº 1, segundo o qual "os dirigentes que, por ocasião de jogos oficiais, comunicarem, fora dos casos previstos regularmente, com os jogadores, directa ou indirectamente, no decurso do jogo, ou interferirem por qualquer forma em incidentes neste verificados, salvo se a sua intervenção for previamente autorizada pelo árbitro e se destinar a auxiliar jogadores lesionados, ou se tiver por fim evitar ou pôr termos a qualquer infracção disciplinar, são punidos com pena de advertência e multa acessória de ¤ 62,50 a ¤ 250,00", ex-vi Artigo 135º, nº 1, segundo o qual "os treinadores (...) que pratiquem as infracções previstas nos artigos 100º a 111º são punidos com as penas de multa nele estabelecidas, sendo as penas de suspensão reduzidas a um quarto.
"Uma grande merda de jogo" e Pedro Barbosa
Temos três situações distintas, a saber, as expressões "uma grande merda de jogo", "não digas isso Pedro, sabes que estás a mentir, não te fica bem mentir" e, por outro lado, as circunstâncias que rodearam a entrega da camisola rasgada.
Vejamos.
De acordo com o artigo 87º é essencial que a expressão proferida seja dirigida contra pessoas singulares ou colectivas integradas na F.P.F.
Assim sendo, e quanto à primeira expressão, "uma grande merda de jogo" não se alcança que dela resulte uma ofensa directa a qualquer dessas pessoas.
É certo que, a expressão não prima pela eloquência, não abonando sobretudo a quem a profere, mas daí a poder ser considerada como atentatória da dignidade e do bom nome dos vários intervenientes naquele jogo vai uma distância que não se pode legalmente percorrer.
Não se trata de fazer aqui a apologia da utilização de linguagem vulgar, ou vernácula, na qual, aliás, a expressão utilizada é uma das menos grosseiras e, talvez por isso, tão utilizada pelo cidadão comum quando algo lhe corre mal, mas apenas a de não se poder esquecer o contexto em que ela surge, logo após a conclusão de um jogo envolvendo duas equipas que lutavam pelo comando da SuperLiga.
Assim, entende-se que a expressão não preenche a plenitude dos elementos do tipo exigidos pelo artigo 87º e, portanto, não pode o recorrente ser condenado.
Analisemos, agora, a segunda situação, ou seja, o que ocorreu durante o "Flash Interview".
Quando o jogador do SCP, Pedro Barbosa, e no decurso da sua entrevista, estava, em directo, a dar a sua opinião acerca do jogo, o arguido interferiu na conversa dizendo "não digas isso Pedro, sabes que estás a mentir, não te fica bem mentir".
Convém aqui, e superando-se a omissão ocorrida no painel factual dado como assente, recordar que, e de acordo com os fundamentos no Acórdão que levaram àquela matéria, a expressão do arguido foi dirigida no preciso momento em que o entrevistado dizia que o jogo tinha sido "um grande jogo de futebol e que, na sua opinião, o Sporting merecia ter ganho".
É perante esta opinião, e não outra, que o arguido referiu as palavras supra aludidas.
Ora, novamente o arguido tem postura censurável, do ponto de vista de conduta social, interrompendo quem está no uso da palavra e de forma pouco própria.
Porém, a impropriedade da forma não é tal que possa ser qualificada de injuriosa.
Analisada friamente, a frase "não digas isso Pedro, sabes que estás a mentir, não te fica bem mentir" pode ser entendida como equivalente à afirmação de que o jogador é mentiroso e, assim sendo, dúvidas não restam de que se está perante um atentado ao bom nome e reputação, ou seja, no caso presente, a uma injúria.
Mas, convenhamos, o mundo e as relações que nele se estabelecem não são assim tão frias, rígidas, onde o que parece é, num sistema de tal maneira inflexível perante o qual as condutas humanas têm de ser analisadas sob a rigidez de uma geometria intelectual, sem espaço para serem levadas em conta as circunstâncias, endógenas e exógenas, que sempre lhes estão inerentes.
Pelo menos, o legislador não o arquitectou assim e é só a ele e ao normativo por ele criado que importa respeitar e fazer cumprir.
Quantas vezes na vida de cada um de nós, arriscamos semelhante palpite, não estivemos já em situação similar, em que nos é negado, com palavras muito próximas, o por nós afirmado, sem que interpretemos essa postura como injuriosa.
São frases inerentes a um fenómeno da vida social, de disputa, de emoção, de multidão, em que a visão clubística impera, um evento onde a serenidade e a imparcialidade de apreciação dos seus intervenientes não são das características mais comuns.
Ora, é exactamente por isso que as afirmações dos seus intervenientes têm de ser analisadas no contexto respectivo, sobretudo, como é o caso, quando à sua volta se cria um clima de exaltação tal que, muitas vezes, não se compreende como é que duas pessoas que se acabaram de despeitar publicamente conseguem, apenas á custa de um bom duche, esquecer tudo e seguirem amigos; também isso é futebol.
Não se nega que há casos em que essas reacções ultrapassam a fronteira que separa a emoção da agressão; assim é, infelizmente.
Mas tal não é, em nossa opinião, o caso.
Como na situação anterior, a conduta do arguido não o abandona socialmente, mas, e mais uma vez, não é de modo a permitir imputar-lhe intenção injuriosa, e esta é elemento subjectivo do tipo legal sem o qual, naturalmente, não pode haver condenação.
Camisola rasgada de Rui Jorge
Falemos, finalmente, da terceira situação, ou seja, as circunstâncias que rodearam a entrega da camisola rasgada.
O Acórdão, e bem, referiu as motivações de facto que presidiram ao estabelecimento da matéria dada como provada, a saber, "livre apreciação, nas declarações do arguido, no depoimento das testemunhas e nas imagens vídeo em circuito fechado do estádio".
Cotejando tais elementos, a primeira constatação é a de que o arguido nega a sua prática, considerando "uma autêntica aberração ser-lhe atribuída a autoria (...) do rasgão".
Analisando os depoimentos das testemunhas inquiridas acerca desta matéria [João Rosado, Artur Ferreira, Paulino Carvalho, Manuel Vidal, Fernando Santos, Eduardo Bettencourt, Paulo Gama, Pedro Mil Homens, Miguel Ribeiro Teles, Rui Jorge, Lourenço Simas, Fernando Brandão, Antero Henrique], resulta, desde logo, que nenhuma afirmou ter presenciado o momento em que a camisola foi rasgada.
Mais, com excepção de duas testemunhas, Fernando Agostinho Moreira Brandão e Paulo Gama, roupeiros, respectivamente, do FCP e do SCP, todas depõem acerca de uma situação que lhes foi transmitida pelos mais variados canais ou de uma conversa a que assistiram.
Por outro lado, não foram captadas quaisquer imagens pelo sistema de vídeo interno que possam ser utilizadas, com propriedade, na análise deste item.
Saneada desta forma a prova, constatamos que, aquelas duas testemunhas têm versões antagónicas, a segunda referindo que a primeira - o que esta nega, em absoluto - "lhe entregou a camisola rasgada e lhe deu o recado", isto é, "dizendo-lhe que o Mister mandava dizer que a tinha rasgado".
Versões antagónicas que lançam dúvidas sobre o que efectivamente aconteceu, dúvidas essas que após análise apurada dos restantes meios de prova não se dissipam.
E não se percebe a razão que permita sustentar ser a versão do roupeiro do SCP mais credível que a do roupeiro do FCP; ambos estão em uníssono quanto a todos os factos, excepto um, e logo o único que para aqui releva: as circunstâncias em que a camisola foi rasgada.
No momento em que a entrega da camisola ocorre estão sós - no que também são unânimes em aceitar - pelo que o que cada um diz pode estar sujeito ao contraditório do outro e o impasse, à falta de outros meios probatórios elegíveis, mantém-se.
E não os encontramos, muito menos nas considerações tecidas a propósito da conduta do arguido.
Não há direitos negativos no processo penal português e o silêncio do arguido não pode desfavorecê-lo.
Se é aceite por todos que o arguido não tem de demonstrar a sua inocência, não é menos insindicável que, nessa qualidade, não lhe é exigido que denuncie o autor dos factos de que é acusado, caso o conheça.
No nosso ordenamento jurídico-penal, não se declara a inocência de nenhum arguido, mas apenas a sua absolvição ou condenação, e as duas primeiras podem ser equivalentes na consequência final, mas retratam situações muitas vezes diferentes; ou seja, entre nós, não se diz que um arguido não praticou determinada conduta, mas apenas que não resultou provado tê-la praticado.
Liedson vs Mourinho
Do Acórdão recorrido resulta claro que, foi objecto de apreciação por parte da Comissão da LPFP a situação à volta do diálogo travado entre o jogador Liedson e o arguido José Mário dos Santos Mourinho e que por falta de sustentação probatória suficiente nenhuma imputação disciplinar ocorreu.
E bem, diga-se, desde já.
Das imagens, das fotografias publicadas e de toda a restante prova documental não resulta indiciado que o arguido José Mário dos Santos Mourinho tenha proferido expressões menos próprias e estas não se podem adivinhar; que houve diálogo, ninguém sindica, mas o que foi dito em concreto, ninguém refere.
Recorde-se, a propósito, que só existe infracção se se verificar atitude injuriosa, difamatória ou grosseira e nos presentes autos qualquer uma delas carece de demonstração.
E o mesmo se diga quanto à afirmação imputada ao arguido ao ter acusado Rui Jorge de "ter feito a coisa mais feia que alguma vez assistira no futebol português".
Trata-se de apenas uma opinião e, como tal, vale o que vale.
Mais. As imagens são elucidativas do que efectivamente ocorreu pelo que qualquer afirmação desfarçada da realidade apenas denuncia a incapacidade do seu autor, seja ele quem for, de formular juízos isentos.
Em relação às restantes situações, também não se encontram fundamentos bastantes para que o arguido fosse pronunciado.
A crítica à arbitragem é inerente ao fenómeno desportivo e o modo como foi feita não revela qualquer intenção difamatória; a confissão pública de que não se gosta do futebol português não merece sequer ser comentada: gostos não se discutem.
Conclusão
Termos em que, e pelas razões expostas, se julga o recurso apresentado pelo recorrente José Mário Santos Mourinho Félix procedente, por falta de fundamentação no que concerne à prova da matéria de facto, absolvendo-o e, consequentemente, improcedente o do Sporting Clube de Portugal".
Resumindo este longo artigo, acabo com o Editorial do Fernando Santos do Ojogo:
Silêncio estranho
Mourinho foi absolvido do célebre caso da camisola rasgada de Rui Jorge. A sentença é já conhecida há uns dias mas regista-se um silêncio sepulcral de todas as partes notificadas. Os vencidos assobiam para o lado e os vencedores, estranhamente, também fazem de conta. Um verdadeiro puzzle interesseiro...
FERNANDO SANTOS
Os silêncios e os ruídos podem significar um mesmo sintoma: de mal-estar ou cumplicidade. A questão está em conseguir-se fazer a melhor leitura das estratégias usadas. Ora, queira-se ou não, a decisão do Conselho de Justiça (CJ) da Federação Portuguesa de Futebol de absolver José Mourinho dos célebres e histéricos acontecimentos que marcaram o Sporting-FC Porto da última época, neles incluída a célebre rábula da camisola rasgada de Rui Jorge, é um autêntico "case study".
O acórdão a fundamentar a absolvição de Mourinho, então treinador do FC Porto, é datado de 30 de Setembro e todas as partes envolvidas foram dele logo notificadas, optando por um silêncio estratégico - pelo menos até hoje, dia em que O JOGO revela os fundamentos da decisão nas páginas 24 e 25. E o que é notável é o caso de Alvalade ter em Janeiro servido de arma de arremesso entre vários protagonistas, os mesmos que agora se meteram na trincheira dos que assobiam para o lado.
A sentença do Conselho de Justiça transita em julgado, isto é, já não é susceptível de nenhum recurso.
Mourinho é, naturalmente, o triunfador: porque ao classificar o Sporting-FC Porto de "uma grande merda de jogo" não primou pela eloquência mas da expressão "não se alcança que dela resulte uma ofensa directa" a pessoas singulares ou colectivas; depois porque, entre outro folclorismo barato, a camisola de Rui Jorge apareceu rasgada mas ninguém, mesmo ninguém, presenciou o momento. Terão alinhado todos pelo diz-que-diz-que...
No campo dos vencidos ficam entretanto o Sporting e a Comissão Disciplinar. O Sporting, que tinha embandeirado em arco com a sentença do órgão de Justiça da Liga, achou pequena a pena, pediu um cúmulo jurídico, e saiu estrondosamente derrotado; o CJ considerou inclusive que "não foram captadas quaisquer imagens pelo sistema de vídeo interno que possam ser utilizadas, com propriedade". Isto é: o que há uns meses se proclamava aos quatro ventos existir ficou-se pela penumbra e o bluff. A Comissão Disciplinar, essa, defendeu a dama das suas deliberações e saiu com o rabo entre as pernas sendo responsável pelo auto-de-fé mal sucedido dos sportinguistas...
Os dados objectivos são, pois, estes e não outros.
À boa maneira portuguesa não faltarão a partir de agora vários argumentos a tentar pôr em causa a Justiça - exercida por juízes e não por curiosos. Far-se-á uma chicana lamentável tentando colar os órgãos decisores a interesses clubísticos, menorizando o essencial: a esmagadora maioria das decisões tomadas pela Comissão Disciplinar são anuladas ou revistas pelo Conselho de Justiça. Sintoma de que algo não vai bem e, como sempre pugnou Valentim Loureiro, presidente da Liga com o mandato suspenso, há que, sem prejuízo da liberdade de acção e da jurisprudência, encontrar uma harmonização de regulamentos e de critérios. Talvez um dia alguém lhe dê ouvidos...