A conspiração contra o campeão (II)
6- A mais extraordinária acusação a Pinto da Costa constante do «livro» de Carolina Salgado era a de que ele lhe teria comanditado a execução do dr. Ricardo Bexiga, vereador da oposição na Câmara de Gondomar, a qual ela teria tentado levar a cabo em colaboração com alguns marginais das suas relações. Extraordinária, porque primeiro era preciso acreditar que Pinto da Costa seria capaz de encomendar a morte de alguém; depois, que se preocupasse em fazê-lo por solidariedade política ou pessoal para com Valentim Loureiro, a quem Ricardo Bexiga fazia frente em Gondomar — e logo na altura em que os dois dirigentes desportivos estavam de relações frias; e, enfim, porque quem lhe escreveu o texto não reparou que, com essa «revelação», ela se incriminava a si própria numa tentativa de homicídio. O Ministério Público resolveu não acreditar na história e arquivou sumariamente o assunto, até porque as contradições em que ela caíra (como a de contar que destruíra previamente as câmaras de vigilância do parque de estacionamento onde a agressão teve lugar e que, afinal, nunca existiram), revelaram que a senhora estava, pura e simplesmente, a inventar. O problema é a dualidade de critério: quando se incrimina a si própria, a testemunha Carolina Salgado não merece credibilidade alguma ao MP; quando incrimina Pinto da Costa, já merece toda.
7- O outro «testemunho» relevante de Carolina Salgado, e que, por si só, justificou a reabertura dos processos criminais arquivados e a punição da CD da Liga, foi a de que durante a cena do «cafezinho», Pinto da Costa teria passado um envelope com 500 contos ao árbitro Augusto Duarte — e este teria aceite. Aqui, é preciso acreditar em duas coisas: que o presidente do FC Porto acharia necessário comprar um árbitro para um jogo que já nada interessava (dirão que foi por serviços passados, mas acontece que, nessa época, Augusto Duarte não apitara ainda nenhum jogo do FC Porto: azar, outra vez…); depois, é preciso acreditar que Pinto da Costa, apesar da irresponsabilidade com que misturou a sua vida pessoal com a vida do clube, seria suficientemente estúpido para corromper árbitros diante da namorada conhecida no «Calor da Noite». Mas a dr.ª Maria José Morgado acreditou e o dr. Ricardo Costa também. Resta uma perplexidade jurídica: já vimos que faltava o nexo de causalidade para dar como provada a corrupção; mas resolver o problema através da esperteza da «tentativa de corrupção» é que não se percebe: se ele deu 500 contos ao árbitro e este os aceitou, porquê apenas a tentativa?
8- Agora, perguntar-me-ão: e as «meninas» para a equipa de Jacinto Paixão — não acredito também que Pinto da Costa tenha dado ordem para aceder ao pedido? Acredito, sim senhor: acredito nisso, não acredito na explicação que ele deu para a etimologia da palavra «fruta». Então se acredito, não acho que seja um caso de corrupção? Não, não acho. Primeiro, porque não havia necessidade alguma; segundo, porque era prática instalada e corrente.
Se para alguma coisa tem servido o julgamento de Gondomar é para demonstrar que, mesmo ao nível de uma terceira divisão, está instalada a tradição de o clube da casa presentear os árbitros com «lembranças». E as «lembranças», que começam por ser peças simples de ouro e refeições de borla nos restaurantes locais, vão subindo de importância à medida que sobe a importância e riqueza dos clubes anfitriões. Nos processos disciplinares instaurados a árbitros pela FPF e decorrentes das investigações do Apito Dourado, os acusados, segundo relatava o JN de 19.03.08, têm-se defendido com o que o ex-árbitro Jorge Coroado (um dos «peritos» usados pela justiça) revela a propósito no seu livro O último cartão: está lá tudo contado, incluindo os presentes que lhe davam e as «meninas» que lhe ofereceram num jogo internacional. E os jornalistas desportivos de Lisboa sabem muito bem quais são os cabarets da cidade onde era possível encontrar árbitros em companhia de «assessores» dos clubes da capital (normalmente, ex-árbitros), e o que lá estavam eles a fazer. Deixem-se, pois, de hipocrisias: se aquilo foi uma tentativa de corrupção, só não são todos arguidos porque o Apito Dourado resolveu escolher apenas dois alvos para investigação.
9- Acontece que, à excepção de uma breve aparição no julgamento de Gondomar — onde foi facilmente trucidada pelos advogados dos réus — Carolina Salgado nunca foi contraditada com a defesa do FC Porto. Protegida e, supõe-se, exaustivamente «trabalhada» pelo MP, nunca teve de se confrontar com perguntas incómodas num tribunal. E, embora as suas declarações ao MP tenham sido consideradas decisivas, nem sequer foi ouvida, menos ainda contraditada, pela CD da Liga, antes de condenar o FC Porto.
Apesar de, em minha opinião, o FC Porto ter sido sempre mal defendido em todo este processo — jurídica e mediaticamente — não é preciso ser adivinho para prever que uma investigação criminal que basicamente repousa só no testemunho de Carolina Salgado, está condenada ao absoluto fracasso no dia que chegar a julgamento. O Benfica não anda a dormir e também o percebeu. Daí que, ao longo de toda esta época, a sua estratégia se tenha desviado das imensas expectativas alimentadas com a nomeação do «dream team» da dr.ª Maria José Morgado para as expectativas da justiça desportiva. Passou a exigir que o CD da Liga se antecipasse aos tribunais e se encarregasse do julgamento, condenação e pena.
10- E o CD fez-lhe a vontade. Aliás, segundo o seu presidente, já em Janeiro eles estavam prontos a decidir o que decidiram em Maio — antes mesmo de deduzirem acusação e estudarem a defesa. Só que havia prazos a cumprir e os prazos baralharam tudo: quando o CD decidiu tirar seis pontos ao FC Porto, já o Benfica estava a vinte de distância e de nada lhe servia a «justiça».
11- Criou-se então a expectativa — devidamente alimentada pelos jornalistas engajados — de que o FC Porto não resistisse à tentação de recorrer da condenação do CD. Isso, mais a conjugação dos prazos do recurso, permitiria que eventual confirmação da pena remetesse o seu cumprimento para a época que vem e, assim, o FC Porto iniciaria a época com menos seis pontos que o «Glorioso». Sempre era alguma coisa…
Creio que eu e Rui Moreira fomos os únicos portistas a defender que, mesmo assim, o FC Porto deveria ter recorrido. Porque, mesmo quando o combate é desigual e o jogo está viciado, há alturas em que se deve ir a jogo, justamente para mostrar a diferença de carácter. Assim não o entendeu a direcção do FC Porto e logo lhe saltaram em cima os benfiquistas do jornalismo a concluir hipocritamente que, se o clube não tinha recorrido, era porque reconhecia a culpa. Olha que chicos-espertos!
12- Todavia, o Benfica mostrou que tinha a jogada muito bem arquitectada e pronta a ser executada. Assim que se soube que o FC Porto não recorrera, o Benfica passou ao plano B: queixinhas à FPF, para que as reencaminhasse à UEFA, a fim de excluir os portistas da Liga dos Campeões, em benefício do «glorioso» 4.º lugar dos encarnados. E também a FPF lhe fez a vontade: a forma como notifica a UEFA de que «ficou provado que o FC Porto cometeu infracção disciplinar muito grave — corrupção da equipa de arbitragem» (só muito mais à frente esclarecendo que foi «sob forma tentada» e nunca esclarecendo que, sobre os mesmo factos, existe um recurso pendente) — é absolutamente esclarecedora do fim pretendido.
13- Mas a verdade é que, aparentemente, este cenário não foi previsto pela, mais uma vez passiva, defesa do FC Porto. Juridicamente, uma hipotética decisão da UEFA, hoje, que venha de encontro à escabrosa pretensão benfiquista seria uma aberração e um abuso. Qualquer ignorante de Direito sabe que não há retroactividade da lei penal e que a tentativa de chamar a isto, não uma sanção, mas uma condição de inscrição ou coisa que o valha, não passa de um exercício de desonestidade intelectual.
Se a lei da UEFA de 2007 se pudesse aplicar a factos passados, o Milan não teria podido disputar a edição deste ano da Liga dos Campeões e a Juventus não poderia disputar a do ano que vem. O problema está em que todos sabem que as decisões da UEFA são jurídicas nuns casos e politicas noutros — e foi nisso que o Benfica apostou. O FC Porto reúne as condições ideais para uma decisão politica e servida como «exemplo»: é um grande clube em termos desportivos, um histórico da Liga dos Campeões, vencedor da prova há apenas quatro anos — mas é também representante de um país pequeno e de direitos comerciais de menor importância face aos tubarões da Europa. O alvo ideal.
14- Seja qual for a decisão da UEFA, o Apito Dourado está condenado à morte. Fez-se tudo o que se pôde, com um objectivo predeterminado e um alvo prefixado. E o resultado envergonha os seus promotores. Quando toda a poeira assentar, ficará para a história apenas como mais um momento em que a inveja dos medíocres ditou a sua lei. É, em grande parte, a história de Portugal.
7- O outro «testemunho» relevante de Carolina Salgado, e que, por si só, justificou a reabertura dos processos criminais arquivados e a punição da CD da Liga, foi a de que durante a cena do «cafezinho», Pinto da Costa teria passado um envelope com 500 contos ao árbitro Augusto Duarte — e este teria aceite. Aqui, é preciso acreditar em duas coisas: que o presidente do FC Porto acharia necessário comprar um árbitro para um jogo que já nada interessava (dirão que foi por serviços passados, mas acontece que, nessa época, Augusto Duarte não apitara ainda nenhum jogo do FC Porto: azar, outra vez…); depois, é preciso acreditar que Pinto da Costa, apesar da irresponsabilidade com que misturou a sua vida pessoal com a vida do clube, seria suficientemente estúpido para corromper árbitros diante da namorada conhecida no «Calor da Noite». Mas a dr.ª Maria José Morgado acreditou e o dr. Ricardo Costa também. Resta uma perplexidade jurídica: já vimos que faltava o nexo de causalidade para dar como provada a corrupção; mas resolver o problema através da esperteza da «tentativa de corrupção» é que não se percebe: se ele deu 500 contos ao árbitro e este os aceitou, porquê apenas a tentativa?
8- Agora, perguntar-me-ão: e as «meninas» para a equipa de Jacinto Paixão — não acredito também que Pinto da Costa tenha dado ordem para aceder ao pedido? Acredito, sim senhor: acredito nisso, não acredito na explicação que ele deu para a etimologia da palavra «fruta». Então se acredito, não acho que seja um caso de corrupção? Não, não acho. Primeiro, porque não havia necessidade alguma; segundo, porque era prática instalada e corrente.
Se para alguma coisa tem servido o julgamento de Gondomar é para demonstrar que, mesmo ao nível de uma terceira divisão, está instalada a tradição de o clube da casa presentear os árbitros com «lembranças». E as «lembranças», que começam por ser peças simples de ouro e refeições de borla nos restaurantes locais, vão subindo de importância à medida que sobe a importância e riqueza dos clubes anfitriões. Nos processos disciplinares instaurados a árbitros pela FPF e decorrentes das investigações do Apito Dourado, os acusados, segundo relatava o JN de 19.03.08, têm-se defendido com o que o ex-árbitro Jorge Coroado (um dos «peritos» usados pela justiça) revela a propósito no seu livro O último cartão: está lá tudo contado, incluindo os presentes que lhe davam e as «meninas» que lhe ofereceram num jogo internacional. E os jornalistas desportivos de Lisboa sabem muito bem quais são os cabarets da cidade onde era possível encontrar árbitros em companhia de «assessores» dos clubes da capital (normalmente, ex-árbitros), e o que lá estavam eles a fazer. Deixem-se, pois, de hipocrisias: se aquilo foi uma tentativa de corrupção, só não são todos arguidos porque o Apito Dourado resolveu escolher apenas dois alvos para investigação.
9- Acontece que, à excepção de uma breve aparição no julgamento de Gondomar — onde foi facilmente trucidada pelos advogados dos réus — Carolina Salgado nunca foi contraditada com a defesa do FC Porto. Protegida e, supõe-se, exaustivamente «trabalhada» pelo MP, nunca teve de se confrontar com perguntas incómodas num tribunal. E, embora as suas declarações ao MP tenham sido consideradas decisivas, nem sequer foi ouvida, menos ainda contraditada, pela CD da Liga, antes de condenar o FC Porto.
Apesar de, em minha opinião, o FC Porto ter sido sempre mal defendido em todo este processo — jurídica e mediaticamente — não é preciso ser adivinho para prever que uma investigação criminal que basicamente repousa só no testemunho de Carolina Salgado, está condenada ao absoluto fracasso no dia que chegar a julgamento. O Benfica não anda a dormir e também o percebeu. Daí que, ao longo de toda esta época, a sua estratégia se tenha desviado das imensas expectativas alimentadas com a nomeação do «dream team» da dr.ª Maria José Morgado para as expectativas da justiça desportiva. Passou a exigir que o CD da Liga se antecipasse aos tribunais e se encarregasse do julgamento, condenação e pena.
10- E o CD fez-lhe a vontade. Aliás, segundo o seu presidente, já em Janeiro eles estavam prontos a decidir o que decidiram em Maio — antes mesmo de deduzirem acusação e estudarem a defesa. Só que havia prazos a cumprir e os prazos baralharam tudo: quando o CD decidiu tirar seis pontos ao FC Porto, já o Benfica estava a vinte de distância e de nada lhe servia a «justiça».
11- Criou-se então a expectativa — devidamente alimentada pelos jornalistas engajados — de que o FC Porto não resistisse à tentação de recorrer da condenação do CD. Isso, mais a conjugação dos prazos do recurso, permitiria que eventual confirmação da pena remetesse o seu cumprimento para a época que vem e, assim, o FC Porto iniciaria a época com menos seis pontos que o «Glorioso». Sempre era alguma coisa…
Creio que eu e Rui Moreira fomos os únicos portistas a defender que, mesmo assim, o FC Porto deveria ter recorrido. Porque, mesmo quando o combate é desigual e o jogo está viciado, há alturas em que se deve ir a jogo, justamente para mostrar a diferença de carácter. Assim não o entendeu a direcção do FC Porto e logo lhe saltaram em cima os benfiquistas do jornalismo a concluir hipocritamente que, se o clube não tinha recorrido, era porque reconhecia a culpa. Olha que chicos-espertos!
12- Todavia, o Benfica mostrou que tinha a jogada muito bem arquitectada e pronta a ser executada. Assim que se soube que o FC Porto não recorrera, o Benfica passou ao plano B: queixinhas à FPF, para que as reencaminhasse à UEFA, a fim de excluir os portistas da Liga dos Campeões, em benefício do «glorioso» 4.º lugar dos encarnados. E também a FPF lhe fez a vontade: a forma como notifica a UEFA de que «ficou provado que o FC Porto cometeu infracção disciplinar muito grave — corrupção da equipa de arbitragem» (só muito mais à frente esclarecendo que foi «sob forma tentada» e nunca esclarecendo que, sobre os mesmo factos, existe um recurso pendente) — é absolutamente esclarecedora do fim pretendido.
13- Mas a verdade é que, aparentemente, este cenário não foi previsto pela, mais uma vez passiva, defesa do FC Porto. Juridicamente, uma hipotética decisão da UEFA, hoje, que venha de encontro à escabrosa pretensão benfiquista seria uma aberração e um abuso. Qualquer ignorante de Direito sabe que não há retroactividade da lei penal e que a tentativa de chamar a isto, não uma sanção, mas uma condição de inscrição ou coisa que o valha, não passa de um exercício de desonestidade intelectual.
Se a lei da UEFA de 2007 se pudesse aplicar a factos passados, o Milan não teria podido disputar a edição deste ano da Liga dos Campeões e a Juventus não poderia disputar a do ano que vem. O problema está em que todos sabem que as decisões da UEFA são jurídicas nuns casos e politicas noutros — e foi nisso que o Benfica apostou. O FC Porto reúne as condições ideais para uma decisão politica e servida como «exemplo»: é um grande clube em termos desportivos, um histórico da Liga dos Campeões, vencedor da prova há apenas quatro anos — mas é também representante de um país pequeno e de direitos comerciais de menor importância face aos tubarões da Europa. O alvo ideal.
14- Seja qual for a decisão da UEFA, o Apito Dourado está condenado à morte. Fez-se tudo o que se pôde, com um objectivo predeterminado e um alvo prefixado. E o resultado envergonha os seus promotores. Quando toda a poeira assentar, ficará para a história apenas como mais um momento em que a inveja dos medíocres ditou a sua lei. É, em grande parte, a história de Portugal.