sábado, junho 26, 2004

José Mourinho

Grande Portugal

Esta manhã, um dos meus jogadores disse-me: "Vou tranquilo para férias, fiz o meu trabalho bem e perdi contra uma grande equipa."

Critiquei as opções iniciais, continuo a pensar que, com uma visão ou convicção antecipada das necessidades da equipa e das qualidades dos jogadores, o período de preparação poderia ter sido utilizado de forma profícua e com um desenvolvimento colectivo tremendo em volta de um núcleo azul.


Continuo a defender, por exemplo, a superior qualidade de Vítor Baía e não são um penálti defendido e um marcado que me fazem pensar que Ricardo é uma opção mais coerente.


No entanto, da mesma forma que, no jogo com a Espanha, elogiei a sua tranquilidade e convicção na resistência a uma pressão que, por vezes, empurra treinadores com pouca estabilidade emocional, agora, após este histórico e memorável jogo, sinto-me na obrigação de voltar a elogiar o seleccionador nacional.

A necessitar de marcar, começou a mexer. Utilizou uma rotina do FC Porto e fez deslocar Maniche para médio mais recuado. Uma dinâmica maior, uma maior velocidade de circulação de bola, uma visão mais ampla da profundidade do jogo - a equipa ganhou outra dimensão e empurrou a Inglaterra para o último terço. Mais tarde sentiu a necessidade de uma maior presença na área e retirou Luís Figo para a entrada de Hélder Postiga. A entrada de Hélder era lógica, pois criaria um novo problema aos defesas ingleses e são as mudanças de rotinas no jogo que maiores dificuldades colocam. O problema e a decisão não era saber quem entrava, mas sim quem sairia. Simão tinha entrado; Ronaldo estava monstruoso; Nuno Gomes fazia a dupla com Postiga; Figo estava bem e quase marcava; Maniche era só o melhor; Deco não parava de trabalhar...

Quem tirar do jogo? A decisão não era fácil e qualquer um que saísse seria um jogador com um rendimento positivo no jogo. Tirou Luís Figo! Fê-lo com convicção e arriscou. Retirar um jogador carismático, de quem se espera sempre o melhor, não é fácil. Outros seleccionadores tiveram em campo as suas estrelas arredadas do rendimento superior e não se atreveram a substituí-las. Scolari fê-lo com Figo e quando o seu rendimento se apresentava alto assim como a sua motivação.

O domínio acentuava-se. Simão e Ronaldo muito bem nas alas, Maniche e Deco como referências no meio-campo, mas o golo não aparecia.

A Inglaterra defendia e não tinha ala esquerdo. Outra decisão - a saída de Miguel, sem adversário directo, a entrada de Rui Costa e superioridade numérica no centro. Golo, prolongamento, golo e meias-finais à vista. A Inglaterra reage e Portugal sem lateral-direito mostra a fragilidade. Deco é a solução - grande momento físico, uma disponibilidade mental enorme para o trabalho de grupo e o sacrifício pela equipa. Reacções perfeitas, empatia táctica, parecia feito. A Inglaterra empata com um golo do Chelsea: cabeceamento de Terry e meia volta, linda, de Frank Lampard.


Penáltis!

Após os falhanços de Beckham e Rui Costa, chegou o primeiro "match point": Maniche. Tremi de pensar na injustiça que seria o melhor jogador português falhar e ficar marcado para sempre. Marcou e respirei. Segundo "match point": se Postiga falhasse, Portugal estava fora, mas a vingança por um futebol que não o adoptou foi fria, como a de Panenka, há muitos anos. Terceiro "match point": desta feita para Portugal, remate forte de Ricardo e Portugal ao rubro. Justamente! Portugal foi o melhor: táctica e mentalmente.

Esta manhã, um dos meus jogadores disse-me: "Vou tranquilo para férias, fiz o meu trabalho bem e perdi contra uma grande equipa."